quarta-feira, 11 de março de 2009

Vivendo a utopia de Lúcio Costa

Brasília, cidade planejada, com suas superquadras, seu comércio local organizado, idealizada para servir de modelo de modernidade, de um progresso que o país atingira à época de sua construção. Quase meio século se passou desde a concepção dos seus traços iniciais e, no entanto, pouca coisa mudou em nossa sociedade desde então. Talvez o Urbanista estivesse muito além de seu tempo, talvez ainda leve mais meio século para que suas aspirações sejam completamente decifradas e respeitadas.

A superquadra idealizada pelo arquiteto parece incompreendida por seus moradores, passeando pelos pilotis dos edifícios é possível ser encontrado todo tipo de descalabro, à cada reforma realizada por um condomínio o desrespeito pelos padrões estabelecidos aumenta. As barreiras para o pedestre são inúmeras, calçadas destruídas ou descontínuas, pilotis com grades, garagens cercadas, muros de arrimo intransponíveis, isso sem mencionarmos o caso da invasão da área pública, prática orquestrada principalmente pelos comerciantes e criminosamente impune pelos órgãos competentes.

Se não bastasse o desrespeito com as reformas, há ainda uma recorrente moda em arrancar parte do cinturão verde, a vegetação concebida originalmente para o embelezamento da cidade e para o conforto higrotérmico e acústico, para dar lugar a uma vegetação arbustiva, exótica e com a função apenas estética (de gosto duvidoso). Em decorrência de tal disparate, diversas fachadas de edifícios antes protegidas da incidência direta do sol, agora encontram-se totalmente expostas à insolação, ocasionando um grande desconforto térmico e aumentando o gasto energético para manter essas edificações frescas.

Nos parece que o urbanista nunca foi bem compreendido em suas intenções pelo povo que habita suas criações. A maioria do comércio local das superquadras sul, dá as costas para a área mais aprazível e bucólica, que é a extensa faixa verde que se extende entre os edifícios comerciais e os residenciais. Ao invés de tirar proveito dessa maravilhosa vista, e estender mesas e cadeiras na calçada pública, como ocorre em diversas outras cidades, ou então abrir um acesso ou uma grande janela para essa esplendorosa natureza, a grande maioria prefere invadir e fechar com alvenaria ou grades para anexar ilegalmente mais área ao seu comércio.

É triste fazer essas observações e mais triste ainda constatar que é preciso um longo caminho até chegarmos a um ponto onde a sociedade esteja preparada para desfrutar das criações de um homem tão a frente de seu tempo, pois é preciso muito investimento em educação e cultura para que os interesses dos cidadãos se voltem para o patrimônio coletivo e não se restrinjam aos interesses mesquinhos e individuais.

William Veras e Heloísa Moura

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